quarta-feira, 13 de março de 2013

A falácia do "Atendimento a Clientes"

Por que as empresas fazem muito menos do que o necessário para o desenvolvimento da qualidade dos seus serviços


Acabo de ler “Rápido e Devagar - Duas Formas de Pensar” (Editora Objetiva 2011), escrito por Daniel Kahneman, Prêmio Nobel de Economia em 2002 pelo seu trabalho intitulado Racionalidade Limitada (Bounded Racionality). Sem dúvida, trata-se de um daqueles livros que dificilmente irá para a prateleira e dentro em breve terá que sofrer um reforço de estrutura, para que possa continuar suportando o fluxo de consultas a que será submetido por mim. Vai se tornar, portanto, mais uma daquelas poucas obras que ficam logo ali, naquela seleta pilha ao lado do teclado de seu computador (você tem a sua, não?).

Na verdade, meu primeiro contato com o questionamento da clássica Teoria da Racionalidade Econômica (o ponto central da Teoria da Racionalidade Limitada) se deu há alguns anos, durante a leitura de um artigo sobre Planejamento Estratégico.
Há pouco mais de dois anos, retomei a leitura desse mesmo artigo, tendo em vista uma Reflexão Estratégica que conduzi para um cliente. Não sei exatamente por que, talvez por estar mais maduro em relação ao tema, essa segunda leitura me impactou de forma diferente e influenciou sobremaneira o trabalho que tinha por desenvolver.

Os questionamentos à Teoria da Racionalidade Econômica e os trabalhos pioneiros da Economia Comportamental, realizados por Herbert Simon, me chacoalharam e me fizeram repensar muito sobre nossas limitações em termos de comportamento econômico, principalmente no que se refere à decisão e escolha, elementos fundamentais para alguém como eu, que trabalha com planejamento.

Perdi um pouco da confiança em mim mesmo, depois que me vi colocado diante daquela nova perspectiva. Fiquei ansioso para tentar entender melhor o que estava experimentando e só parei depois de muito pesquisar e ler o que encontrei sobre o tema. Daí, para chegar à obra de Kahneman foi um pequeno passo.

Posso dizer que de lá para cá, tanto o trabalho de Simon, como o de Kahneman, estão “sempre por ali”, de alguma forma pautando meus estudos na área do comportamento humano. Volta e meia os mesmos são citados como referência em artigos e livros que fizeram, e tem feito, parte de minhas leituras cotidianas.

Mais recentemente, descobri um vídeo de uma palestra de Kahneman ocorrida em um encontro do TED. Desde então, o mesmo passou definitivamente a integrar o material de apresentação da minha abordagem de trabalho na área de serviços e atendimento a clientes. O vídeo é imperdível. Chama-se "O Enigma da experiência versus memória". Recomendo-o.

Em “Rápido e Devagar”, considerado um dos melhores livros de 2011 pelo The New York Times Book Review, Kahneman revisita de forma acessível e estimulante seus cinquenta anos de pesquisas e descobertas na área da Psicologia e da Economia.



O simpático “velhinho” (Kahneman está prestes a completar 80 anos) é brilhante e tem uma imagem cativante. Imagino que ele, melhor do que ninguém, saiba bem o quanto isso lhe rende em termos de atenção e repercussão, pois o seu estilo de abordagem e sua linguagem seguem essa linha. Da minha parte, preciso controlar a simpatia gratuita que desenvolvi por ele, pois isso contribui para a criação de um viés afetivo positivo, o que certamente enfraquece a minha imprescindível capacidade de análise crítica sobre seu trabalho. Afinal, como ele mesmo defende, precisamos garantir nossa consciência e imparcialidade, de forma a mantermo-nos livres de vieses.

Além da curiosidade prévia que tinha por sua obra, meu interesse por esse livro, em específico, se deveu a um aspecto mais objetivo e prático da minha vida profissional atual: eu queria melhor entender o processo de avaliação e tomada de decisões das pessoas, com vistas a me tornar mais efetivo no processo de divulgação do meu trabalho e venda dos meus serviços.
Já há quatro anos venho batendo insistentemente na tecla da importância de se melhor compreender e trabalhar os aspectos emocionais e subjetivos inerentes à relação de empresas/atendentes e clientes, em prol de melhores resultados para ambas as partes. É o que chamo de Abordagem do Atendimento Emocional. Na tese que defendo, e que adoto no trabalho que realizo junto às equipes e estruturas de serviços e atendimento que tem passado por ele, parto do princípio de que há uma enorme oportunidade de melhoria da qualidade da prestação de serviços, possível de ser obtida principalmente pelas empresas, a partir do desenvolvimento da capacidade de suas equipes de contato, de melhor reconhecerem, entenderem e lidarem com os aspectos afetivos inerentes ao seu negócio, produto e marca e que, fundamentalmente, compõem a sua relação com os clientes.
A época do “cliente tem sempre razão” já passou. Conforme explorei em artigo anterior publicado nesse mesmo blog. Há que se considerar agora Razão e Emoção com o mesmo grau de importância.

Apesar de ainda não ter constituído uma amostra suficientemente grande e capaz de demonstrar de forma inequívoca os benefícios da minha abordagem, é notório o impacto que a mesma tem provocado, não só na qualidade da atuação, como também na redução do nível de estresse e consequentemente do turnover das equipes de atendimento que através dela foram capacitadas (Clique aqui e conheça o Case Cyrela Andrade Mendonça). Mas como defende o próprio Kahneman, amostras muito pequenas correm o grande risco de resultados extremos e tendenciosos. É o chamado “efeito dos pequenos números”.

Adoraria ter, como o célebre Kahneman parece sempre ter tido, um enorme apoio e recursos para o desenvolvimento dos meus trabalhos de pesquisa e confirmação da tese, mas essa, infelizmente, não tem sido minha realidade até aqui. Portanto, meu desafio passou a ser mesmo “colocar a abordagem no ar”, através da minha atuação como consultor empresarial independente. Até imaginei uma tentativa pelo caminho acadêmico, mas por sugestão de uma amiga, que atua no meio e a quem muito respeito, fui aconselhado a desconsiderar essa opção. Pela sua avaliação, os custos não justificariam os benefícios. Além do que, segundo ela, as verbas para pesquisas acadêmicas são raras e disputadíssimas em nosso país, e dificilmente eu conseguiria obtê-las para financiar meu projeto. Por último, ela foi categórica ao afirmar que a comprovação científica da minha tese pouco agregaria ao meu trabalho. Não conformado com seus conselhos, tentei ainda mais alguns contatos, mas infelizmente a experiência só ratificou a previsão feita. Contatei também alguns profissionais que conheço e que atuam na área de pesquisa de mercado; afinal, a grande maioria das teorias na área comportamental são sustentadas por dados estatísticos obtidos a partir de pesquisas. Assim, me pareceu óbvio e interessante desenvolver algo semelhante para a minha abordagem. A ideia era fazer algo em parceria. A receptividade à apresentação do meu projeto foi sempre muito boa, mas infelizmente o corre-corre diário dos negócios naturalmente acaba por colocar projetos inovadores, como o meu, em segundo plano. Enfim, até agora só bons contatos mas nenhuma evolução.

Sempre fui muito otimista, portanto, não costumo me abalar com esses obstáculos e dificuldades que considero normais em qualquer empreitada desse tipo. Além do que, os benefícios da minha abordagem me parecem muito óbvios, portanto, acredito que seu verdadeiro despertar e sucesso são apenas uma questão de tempo e persistência (espero não estar com miopia causada por minha própria teoria e o desejo de vê-la emplacar). Mas isso não significa que eu fique passivo a espera do tempo conspirar a meu favor. O esforço de tentar entender melhor o processo de escolha e tomada de decisões é uma iniciativa que conduzo nesse sentido, e a leitura de “Rápido e Devagar” foi muito contributiva. Tanto que quero incorporá-la à minha própria abordagem.

A leitura do livro me deixou tão entusiasmado que decidi escrever esse artigo e assim compartilhar algumas das minhas descobertas sobre o que acredito serem as razões pelas quais as empresas têm um nível de atenção e investimento muito aquém do necessário, no que diz respeito ao desenvolvimento das suas competências de entrega, mais especificamente, no seu aparato de atendimento a clientes.

Questões intrigantes

Vou então começar esse compartilhamento visitando as questões originais sobre o tema, que me intrigavam, e que me fizeram ir a fundo no entendimento do trabalho de Kahneman:

1. Por que há tão pouco empenho concreto das empresas em melhorar a qualidade dos seus serviços (atendimento), quando o dado estatístico é tão negativamente impactante?

Quase 7 clientes, a cada 10, trocam de fornecedor por problemas de atendimento.

Por falar em perda de clientes, vai aqui uma pergunta específica para você que me lê:
Você sabe quantos clientes sua empresa perdeu no último ano, ou no último mês?
Ficou sem resposta?...
Normalmente é o que acontece.

Mas vamos retomar as questões originais:

2. Por que as empresas, apesar desse dado estatístico inequívoco, continuam acreditando que perdem clientes por preço?

3. Por que o insipiente trabalho que é feito há anos na tentativa de capacitar as equipes de atendimento insiste numa abordagem racional que prioriza scripts, quando o resultado é esse que está aí? Por que não estão à procura de novas abordagens?

4. Por que as empresas estão muito mais dispostas a assumirem gastos com suas estratégias e equipes de vendas, do que com suas estratégias e equipes de atendimento?

Segundo estudo divulgado pela Harvard Business Review, a redução de apenas 5% da evasão de clientes pode gerar um incremento de 30 a 85% da lucratividade, a depender do ramo de negócios. Ainda no mesmo foco, segundo Fred Reicheld, autor e estrategista de negócios, já ao final da década de 1990, conquistar um novo cliente poderia custar até 5 vezes mais do que reter um existente.

Finalizo essa “sessão interrogatória” com mais duas perguntas específicas sobre sua realidade:
Sua empresa apresenta o mesmo nível de arrojo para definir metas de redução de evasão de clientes, do que o apresentado para a conquista de novos (aumento das vendas)?

Na sua empresa são realizadas convenções e grandes encontros com igual frequência para a equipe de vendas e para a equipe de atendimento?

Vendas x Atendimento


Antes de evoluir com as respostas, queria dizer que apesar de colocar Vendas e Atendimento em oposição nessas questões finais, não as vejo assim. Aliás, ao contrário, em minha opinião, ambas são competências fundamentais e interdependentes. No entanto, ao refletir sobre as possíveis razões do baixo nível, da dispersão e da falta de consistência dos investimentos em atendimento, acabei me dando conta de que em relação às vendas, uma competência tão similar e próxima, o cenário é radicalmente oposto. Isso me deixou especialmente confuso e intrigado, principalmente depois do que li em “Rápido e Devagar”. Achei, portanto, que poderia haver aí alguma boa pista para a solução das questões originais, e talvez essa fosse uma boa estratégia para abordá-la.
Depois do que li, passei a considerar como uma das hipóteses possíveis o fato de que na gestão diária dos negócios essa “disputa” se dá porque os recursos das empresas são limitados, tanto em termos financeiros como, principalmente, em termos de disposição e interesse dos gestores. Se isso for verdadeiro, as questões então passam a ser: Por que esse desequilíbrio se dá? Por que há “preferência” pelas Vendas?
Sem dúvida, o Atendimento teria muito a ganhar se tivesse a mesma atenção e o mesmo nível de investimentos que as Vendas. Apesar de ser um tema que tem tido destaque (pelo menos aparente) na pauta das empresas e na mídia especializada, a qualidade do atendimento nada tem avançado nos últimos anos, e isso muito provavelmente se deve à falta de investimentos, se não em quantidade, talvez em qualidade. O dado concreto é que essa inércia precisa ser quebrada.
Mas por que isso não se dá?


Vieses e Heurísticas
Arrisco-me a estabelecer aqui algumas razões:
Segundo Kahneman, temos duas formas de pensar: uma mais rápida e intuitiva, outra lenta e preguiçosa, que é mais lógica e deliberativa. Para efeito meramente didático o autor chama a primeira de Sistema 1 e a segunda, de Sistema 2. Como acho que isso funcionou perfeitamente na minha compreensão do tema ao ler o livro, vou repeti-lo aqui.

Nossa tendência (acho que nem precisaria dizer, mas enfim...) é atuarmos o maior tempo possível no Sistema 1. E não poderia ser muito diferente, pois por natureza buscamos sempre o menor esforço em tudo o que fazemos. De mais a mais, viver utilizando o Sistema 2 seria muito complexo, lento e cansativo. Além do que, há situações em que uma resposta rápida e automática é imprescindível, e para essas, sem dúvida, o Sistema 1 é o mais eficaz.  Simplificadamente, o que Kahneman propõe é que saibamos conjugar, da forma mais adequada possível, os dois sistemas e assim tornarmo-nos menos suscetíveis a vieses e heurísticas, que por sua vez nos levam a interpretações enganosas e distorcidas da realidade, comprometendo nossos entendimentos, escolhas e decisões (elementos determinantes nos cenários que destaquei em meus questionamentos sobre o Atendimento).

Vamos então explorar um pouco mais essa questão dos vieses e heurísticas, dentro do contexto das Vendas versus Atendimento. Por exemplo, vejamos os vieses que geram confiança excessiva: a ilusão de que tudo tem causa e é previsível (a descrença no aleatório), a ilusão de controle (a crença de que podemos entender, portanto, prever e controlar a realidade), a ilusão de validade (a confiança excessiva na validade dos modelos e critérios de avaliação e escolha que nós mesmos criamos) e as ilusões de habilidade (a nossa autoatribuição de competências que na prática nem sempre se confirmam). Há muitos desses vieses na percepção dos gestores em relação às Vendas. Em minha opinião, e parece-me que as pesquisas semelhantes apresentadas no livro sobre o impacto do CEO’s na gestão das empresas o sustenta: a crença dos gestores na sua capacidade de influenciar e controlar o desempenho das Vendas nos seus negócios é muito maior do que de fato a realidade mostra. Em outras palavras, a crença na capacidade é maior do que a capacidade de fato.

Pare alguns minutos para refletir:
Será que de fato as vendas são controláveis?

Em que medida os produtos e serviços são comprados, e não, vendidos?
Quantas vendas as empresas efetivamente deixariam de fazer se eliminassem toda a sua estrutura e equipe de vendas?

Calma! Não estou propondo isso, mas apenas me utilizando dessa provocação para levá-lo de fato a pensar sobre a capacidade de influência que as empresas e seus gestores têm sobre o processo de escolha e tomada de decisão dos seus clientes no âmbito das vendas.
O fato é que é muito forte a crença dos gestores na ideia de que não há nenhum caráter aleatório no comportamento das vendas, e nem mesmo fenômenos como o de regressão à média (Kahneman, D. Rápido e Devagar – Duas formas de Pensar, pág. 222-233). Em realidade, os gestores não têm dúvidas de que as vendas se dão segundo causas específicas, identificáveis, previsíveis e controláveis; e que seus critérios de avaliação do que é bom ou ruim (em vendas), assim como sua habilidade para lidar com elas é elevada. E essa, em última instância, é a razão do enorme interesse e empenho especiais desses mesmos gestores para com o desenvolvimento dessa competência empresarial.

Não quero aqui discutir a validade dessas crenças, defender seu nível de exagero, ou a tese de que são apenas ilusões; o que quero é destacar o curioso aspecto de que, em relação ao atendimento, esse cenário é diametralmente oposto.

Duas realidades distintas


Ora, as duas atividades se dão basicamente a partir da interação entre pessoas (clientes e representantes da empresa), portanto, ambas estão sujeitas ao mesmo grau de subjetividade e incertezas.
Seriam então seus processos muito distintos?
Não creio.

Ambos parecem seguir uma mesma estrutura de interação: rapport, identificação de necessidades, ajuste da solução e fechamento do compromisso (no caso do atendimento, a entrega em si).

Qual seria então o elemento diferenciador, que faria da venda um processo aparentemente mais interessante e mobilizador do que o atendimento?
O que é ainda mais estranho (pelo menos para mim) é ver que o foco principal das ações de desenvolvimento em vendas é o investimento no potencial e no talento dos seus profissionais (os vendedores), enquanto que no atendimento, o mesmo se dá prioritariamente nos sistemas e nos processos operacionais, cabendo aos profissionais da área (os atendentes) apenas um papel secundário, marcado por uma espécie de atuação rígida e pré-programada. Dada essa condição, não deve surpreender, portanto, que o turnover nessa área seja tão elevado quanto o é, afinal, a motivação e o engajamento com o trabalho se devem essencialmente, e em boa parte, à perspectiva que o trabalhador tem de influenciar a sua atuação e o seu ambiente. Este fator fica seriamente prejudicado diante da estratégia escolhida.
Eu acredito que essa diferença de percepção entre a Venda e o Atendimento se dá, também, na medida em que há nas empresas muito mais informação disponível sobre a primeira em relação à segunda. É o que Kahneman chama de WYSIATI – What you see, is all there is (O que você vê é tudo o que há). Nosso entendimento da realidade depende e é fortemente influenciado por WYSIATI. Damos preferência e maior atenção ao que está mais disponível, e as informações sobre Vendas são mais ricas, mais bem organizadas e mais acessíveis. A falta de informações sobre o atendimento, por sua vez, coloca-o em desvantagem na disputa pela atenção e mobilização dos gestores, consequentemente, o mesmo acaba por ter menor acesso aos recursos destinados ao desenvolvimento empresarial. Ainda mais além, acredito que só em relação às vendas se dá outro fenômeno interessante e que contribui para a sua primazia em termos de atenção da gestão. Refiro-me à associação direta e aparentemente natural (porém não necessariamente correta e verdadeira) que se dá entre os esforços e investimentos feitos no seu desenvolvimento (capacitação das equipes, etc.) e o resultado das vendas em si. Isso é muito comum, ou seja, a melhoria das vendas ser sempre relacionada ao investimento feito no desenvolvimento e motivação das suas equipes dedicadas. É o chamado viés do resultado (Kahneman, D. Rápido e Devagar – Duas formas de Pensar, pág. 254-256). É claro que esse pensamento é questionável, visto que as vendas estão condicionadas também a uma série de variáveis externas e não controláveis.
O mesmo não ocorre com o atendimento. Além de não haver consenso sobre a validade dos investimentos feitos na capacitação das equipes de atendimento (o que a meu ver é mesmo ruim, mas basicamente porque as abordagens adotadas até aqui são inadequadas), as medições de desempenho do atendimento são na sua grande maioria precárias, inadequadas e muitas vezes distorcidas. As medições do número de reclamações e do nível de satisfação dos clientes são bons exemplos disso. Reclamações podem muito bem indicar aumento no nível de engajamento dos clientes e não queda na qualidade dos serviços. Assim sendo, sua elevação pode ser um bom, e não, um mau sinal. Isso sem contar na heurística contida na interpretação e resposta dos clientes, aos inadequados questionamentos sobre o seu nível de satisfação. Perguntar a um cliente se ele está satisfeito é colocá-lo diante de uma reflexão tão complexa e subjetiva como seria, por exemplo, perguntar a ele se é uma pessoa feliz. Aliás, em relação a isso me pergunto por que as empresas não avaliam a satisfação dos clientes de forma mais simples e representativa como, por exemplo, identificando regularmente e em momentos específicos do atendimento, seus sentimentos imediatos (natureza e intensidade). Afinal, as emoções são os melhores indicadores dos comportamentos futuros dos clientes. De mais a mais, satisfação não garante vínculo, emoção sim (Prof. Richard Edwardson, Universidade de South Wales).
Enfim, há muito que melhorar em termos de WYSIATI para o atendimento. Sem dar mais qualidade e visibilidade às suas informações, dificilmente o atendimento conquistará o espaço que merece junto aos gestores e, principalmente, na conquista dos investimentos necessários ao seu desenvolvimento.

Custos ou Perdas
Há ainda outro viés importante a ser destacado. Trata-se da nossa aversão a perdas.
Todos nós temos uma tendência a ser restritivos na avaliação das situações sempre que há risco de perda envolvido. Detestamos perder, muito mais do que gostamos de ganhar, e isso contamina nossa imparcialidade na avaliação de cenários e na tomada de decisões. A primeira questão da “sessão interrogatória” tratou disso (ou pelo menos deveria). Foi quando citei que o principal motivo de evasão de clientes são os problemas de atendimento, ou seja, quase 7 em cada 10 “vão embora” por problemas de atendimento.

Eu tinha certeza de que esse dado estatístico seria suficientemente forte e impactante para mobilizar de forma contundente os gestores na busca da melhoria do atendimento, mas em realidade isso não acontece. A razão desse comportamento passivo provavelmente está no que Kahneman chama de “contas mentais” (Kahneman, D. Rápido e Devagar – Duas formas de Pensar, pág. 429-433). Nesse caso específico, vou tomar a liberdade de me referir a esse fenômeno como a “contabilidade” que se dá na mente dos gestores e que envolve a perda de clientes. Essa “contabilização mental” diz respeito ao processo mental automático (Sistema 1) de comparar, ponderar e eventualmente compensar perdas, despesas e ganhos. O resultado dessas contas está diretamente ligado à promoção de um estado mais ou menos intenso de tranquilidade ou intranquilidade, e consequentemente de autoconfiança ou insegurança, que por sua vez irá influenciar o processo de escolhas e tomada de decisões econômicas.
A evasão de clientes não me parece que seja considerada uma perda, mas sim, um custo, o que é algo totalmente diferente. Uma vez que é assim mentalmente “contabilizada”, a perda de clientes assume uma condição de parte integrante do negócio, ou seja, algo inerente a sua dinâmica e composição. O efeito dessa inadequada consideração se torna ainda mais nefasto, na medida em que a contabilidade de fato não a evidência (ela simplesmente não aparece em nenhum plano de contas), o que lhe garante ainda mais a sua característica de invisibilidade e, consequentemente, a sua perpetuação em maior ou menor nível. Além do que, um custo não soa estranho e nem causa tanto impacto quanto uma perda. Um custo geralmente chama menos atenção da gestão.
Lembro-me bem, quando ainda era gestor de hotel, vivi diversos momentos de crise em que tive que adotar estratégias de redução de gastos (custos). O meu esforço para trabalhar essa questão parecia enorme, mas o que de fato fazíamos era bem pouco do ponto de vista da exigência verdadeira. Em verdade, nós apenas descartávamos elementos menos necessários e prescindíveis. Eram geralmente elementos que haviam sido acrescidos à operação, assim como as “reservas de gordura” que acumulamos ao nosso corpo. São fáceis de ganhar, mas dificílimas de perder. E sua identificação e extinção exige um enorme esforço que é muito mais mental do que físico. Ele requer prioritariamente um esforço do Sistema 2.
O combate à evasão de clientes, eu diria, é ainda mais difícil, pois ela não está no foco de atenção visível dos gestores. O que dizer então da necessidade de mobilização, organização e persistência, que sua efetiva redução exige. Cortar qualquer custo é relativamente mais fácil e eficaz do que tentar reduzir o custo da evasão de clientes, portanto, na linha das prioridades ele parece ocupar sempre as últimas posições. Se fossem percebidas (vistas e sentidas) como uma perda, talvez a situação fosse bem diferente. Para imaginar que cenário possível seria esse, basta ver o que acontece em relação às vendas não fechadas. Apesar de aparentemente não fazer muito sentido, as vendas não fechadas são consideradas perdas (e não custos). Digo que não faz sentido porque uma venda planejada não é algo que efetivamente uma empresa tenha, mas algo que quer ter. Diferente de um cliente que se tem e por falha de atendimento efetivamente se perde. Uma venda não é uma posse, mas sim uma possibilidade, logo, não deveria ser percebida como uma perda. Mas não é isso que o Sistema 1 dos decisores empresariais considera. Eles têm aversão à possibilidade de perder uma venda e se mobilizam especialmente para isso.

Concluindo
Enfim, são muitas as armadilhas cognitivas e afetivas que sustentam o atual entendimento do cenário empresarial envolvendo o atendimento.

Por sua vez, minha abordagem (o Atendimento Emocional) é inegavelmente mais complexa que a abordagem até então vigente. E complexidade é custo, como afirma Kahneman. Não o custo com treinamento ou aumento de estruturas, mas sim, o custo natural de todo processo de mudança e de aprendizado. Para que este custo seja compreendido e aceito, os decisores empresariais precisam reconhecer de forma clara e inequívoca seus benefícios. Aí talvez esteja a minha grande dificuldade, pois esse processo compreende fundamentalmente a superação, senão total, pelo menos parcial dessa enorme gama de vieses que hoje habita a mente e os pensamentos desses decisores. Assim sendo, me parece que a melhor alternativa estratégica para a consecução dos meus objetivos é a minha incondicional disposição em tornar esses vieses conhecidos, dando aos decisores a oportunidade de rever seu entendimento da sua realidade empresarial, e em especial da sua estrutura e abordagem de prestação de serviços e atendimento a clientes.


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2 comentários:

  1. Oi André, bem interessante o artigo.
    Só hoje descobri q vc tem um Blog.

    Estou atualizando um LIVRO de RH, gostei de um artigo seu no site da Lucila Quintino e sai buscando coisas novas na Pollus acabei aqui.
    Bjs e Bom Domingo
    Simone Sansiviero

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    1. Obrigado pela apreciação do artigo, Simone.
      Meu blog é para mim o veículo onde registro e disponibilizo meu pensamento e ideias a respeito de temas que hoje tem sido mais profissionais do que pessoais.
      Diferente da maioria dos blogueiros atuais, a priori, quero disponibilizar apenas o que eu produzo. E como escrevo somente quando acredito que tenha algo relevante a comunicar, não estranhe se passar um bom tempo sem publicar.
      Mas apreciaria que continuasse lendo e comentando meus artigos.
      Se puder lhe ser útil nessa sua empreitada da atualização do livro, me avise.
      Abraços!

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