domingo, 19 de fevereiro de 2012

A Evolução da Gestão na Indústria Hoteleira Nacional

A Hotelaria é um negócio sui generis que possui características que a tornam especialmente interessante e propícia à adoção, num formato adaptado, do modelo de gestão baseado na chamada Estratégia Empresarial, Estratégia de Negócios, Estratégia Competitiva, ou apenas, Estratégia.

Sejam unidades pertencentes a uma grande rede, ou negócios isolados e independentes, num hotel tem-se todas as funcionalidades e a complexidade próprias de um negócio completo: o planejamento, a concepção de produtos e serviços, a precificação, a promoção, a venda, a produção, a cobrança, o controle e a análise de resultados.

Para entender melhor a distinção que estou tentando fazer em relação à hotelaria, consideremos outros ramos de atividade, como por exemplo, os setores automobilístico, farmacêutico, bancário e de telecomunicações. Nesses, a estrutura das organizações é fragmentada em divisões, filiais ou grandes departamentos, e seus gestores cuidam normalmente de apenas um "pedaço do negócio", ficando a visão e a gestão integral a cargo de estruturas específicas, centralizadas e corporativas. 

Isto posto, quando o gestor de um hotel se engaja num processo de reflexão, planejamento e gestão estratégica, ele tem sob seu foco de trabalho, controle e responsabilidade todos os aspectos e funcionalidades inerentes ao seu negócio. Já o gestor equivalente das organizações citadas anteriormente como exemplo, mesmo tendo uma estrutura de recursos e orçamento muitas vezes maior, não exerce mais do que apenas influência sobre aquelas funcionalidades locadas fora de sua área de responsabilidade.  Logo, não só o exercício da gestão estratégica fica “mais inteiro na mão do gestor”, no caso da hotelaria, como também o impacto da sua aplicação ocorre de forma mais rápida, mais fácil de ser percebida e avaliada, e por que não dizer, mais intensa, o que favorece a própria dinâmica da “experiência estratégica”. A hotelaria se torna então também um excelente ambiente para o desenvolvimento de estudos, experimentações, conclusões e a evolução do próprio modelo de Gestão Estratégica.  

Não obstante, até a segunda metade da década de 1990, os hotéis no Brasil, mesmo os de redes internacionais, eram geridos como se fossem sistemas fechados, ou seja, como estruturas que funcionassem de forma restrita ao seu contexto interno. Um modelo radicalmente inverso ao proposto pelo Pensamento Estratégico, que parte do princípio de que as empresas são sistemas abertos, em permanente interação com o seu ambiente externo.

Na época, as práticas de gestão dos hotéis seguiam estritamente aos preceitos exclusivos da hotelaria, uma atividade secular, e talvez por isso, repleta de dogmas. As perspectivas dominantes no dia a dia da gestão dos empreendimentos eram as que consideravam o olhar da realidade “de dentro para dentro” e “de dentro para fora”, sempre marcadas por uma forte mentalidade tecnicista e operacional. A postura dos gestores era apenas reativa, e as razões encontradas para justificar momentos de turbulência eram quase sempre baseadas em possíveis problemas ou disfunções operacionais internas. Em relação ao mercado, quando este, como lhe é peculiar, por algum motivo apresentava descontinuidade, o movimento de adaptação dos negócios, quando ocorria, era lento e muitas vezes insuficiente. Vendas era a única funcionalidade onde havia uma interação verdadeira entre o ambientes interno e externo do negócio. E não poderia ser diferente, é claro.

Em verdade, a indústria hoteleira, ou melhor, o negócio hoteleiro em si estava começando a viver o seu grande salto de profissionalização, motivado pela necessidade de adoção de padrões de gestão compatíveis com o de outros segmentos de negócio mais maduros e consagrados, uma vez que se tornara uma nova opção preferencial de investimento, inicialmente para os pequenos e médios investidores, e depois, para os grandes fundos de private equity nacionais e internacionais.

Arrisco-me a dizer que foi mesmo na segunda metade do ano de 1997 que se iniciou um movimento que impactou, e vem impactando até hoje, o modelo de gestão da hotelaria brasileira.

Naquela ocasião, a Universidade Corporativa do Grupo Accor, onde eu atuava, acabara de trazer de sua matriz na Europa o know how de treinamento de equipes para hotéis em fase de abertura, pois era o início do seu processo de retomada do desenvolvimento e intensificação de crescimento, aliás, da hotelaria nacional como um todo.

Como parte integrante desse esforço, a exemplo do que existia na Europa, a unidade brasileira desenvolveu um programa modulado ao qual, dentro de um processo de adaptação à realidade brasileira, se deu a inclusão de um módulo de Planejamento Estratégico, uma prática que já vinha sendo introduzida em outras divisões do Grupo, havia algum tempo. A partir daquele momento, todas as novas unidades hoteleiras do Grupo, não só passaram por processos de Reflexão e Planejamento Estratégico como também tiveram suas equipes formadas a partir desse modelo.

Depois disso, foi uma questão de tempo para que a prática fosse amplamente disseminada pelo mercado nacional, tanto nas aberturas de novos hotéis, como em processos de troca de bandeira (operadora), ou mesmo em hotéis já em operação.

O que se viu foi então uma grande transformação no modelo de gestão que hoje é adotado, se não em todos, de certeza na grande maioria dos hotéis brasileiros, em que os gestores passaram paulatinamente a melhor acompanhar e entender o impacto da contínua dinâmica de interação entre os ambientes, interno e externo do seu negócio.

A prática da reflexão estratégica e a consequente elaboração de planos estratégicos passaram a ser uma rotina, e hoje já não são mais novidade, ferramentas como Análise SWOT, Matrizes BCG e GE-McKinsey, Análise de Posicionamento e conceitos como Fatores Críticos de Sucesso, Competências Essenciais e Objetivos Estratégicos. Antes limitadas às grandes corporações e seu nível mais estratégico, essas ferramentas e práticas são hoje utilizadas também por estabelecimentos independentes e de todas as categorias e dimensões.

Mas essa grande transformação ainda precisa cumprir a sua última etapa.

Em termos práticos, o que se vê é que a adoção sistematizada de uma estratégia ainda agrega muito pouco ao resultado dos negócios dos empreendimentos hoteleiros. Isso se dá por uma única razão: os Planos Estratégicos precisam dar origem a uma verdadeira Gestão Estratégica.

Há uma grande distância entre o contexto do planejamento estratégico e o contexto da gestão diária do empreendimento. Nesse sentido, se por um lado há uma boa disposição de muitos gestores em refletir estrategicamente sobre seu negócio e ao mesmo tempo, em empenhar-se na elaboração de planos e estratégias que envolvem relativa complexidade, por outro, há uma grande dificuldade desses mesmos gestores para transformar esses planos em realizações e ações concretas no seu dia a dia, e de suas equipes.

É claro que o Plano Estratégico não pode ser entendido como um fim em si mesmo – uma peça definitiva e acabada sob a qual se dará todo o contexto da operação diária do hotel –, afinal, os ambientes são dinâmicos, as realidades idem, e mais importante do que o plano é o exercício do planejar, uma atividade que deve ocorrer de forma regular e contínua. Mas o importante a pontuar aqui é que parece mesmo faltar aos gestores a capacidade de aplicar a sua produção estratégica intelectual no contexto prático e operacional. Em outras palavras, falta traduzir e espelhar o plano e as estratégias nas ações cotidianas, como por exemplo, referenciar nelas o estabelecimento de suas prioridades e a sua tomada de decisões rotineiras.

Isso é talvez fruto de uma postura excessivamente voluntarista e criativa, quando não fantasiosa, por parte dos gestores, muito comumente apresentada na etapa de planejamento, razão pela qual muitos planos acabam por se constituir em projetos pouco factíveis, distantes demais da realidade prática da sua aplicação. Muitos “projetos” nunca saem da gaveta, o que acaba também por causar certo sentimento de frustração em seus criadores.

O exercício da Gestão Estratégica pressupõe que o gestor seja capaz de ir além do identificar e compreender acuradamente os ambientes, interno e externo do seu negócio, do elaborar planos que otimizem recursos, oportunidades e promovam a antecipada e adequada adaptação às mudanças de contexto, o gestor tem que saber transformar a estratégia numa referência compreensiva, válida, concreta, dinâmica, evolutiva e contagiante, e a partir dela mobilizar todos os níveis de atuação da sua organização.

Só com esse ciclo completo veremos efetivamente a concretização do real potencial que a abordagem estratégica é capaz de agregar aos resultados dos seus negócios hoteleiros.



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